quinta-feira, setembro 07, 2006

Língua presa, mas o rabo solto!

Durante toda a minha vida escolar fui cercada por colegas de classe que se aproveitavam do meu sotaque interiorano para caçoar de mim. Quando o alarme do recreio soava, era atacada por um enxame de irmãos mais velhos desses mesmos colegas, que encontravam as formas mais variadas para manter uma conversa e ter seu curto descanso marcado por grandes gargalhadas.

Com o decorrer do tempo, a pronúncia foi suavizando e perdendo um pouco a evidência. Jamais perdi, contudo, a individualidade de meus “esses” e “erres”. Nunca senti necessidade de ser, agir ou pensar igual aos outros, mas ser apontada por ser diferente também não era agradável. De qualquer maneira, acabei por acostumar com certas piadinhas, que por fim perderam a graça de todo e deixaram de ser causa de desconforto para mim.

Foi na adolescência, durante infinitas horas de observação em frente ao espelho que eu me descobri com a “língua presa”. A partir daí, não ousei mostrar a língua para mais ninguém, com medo de ter minha pequena deficiência reconhecida. Excluindo certas questões que fogem de comentários sadios (rsrs...) em poucas situações me vi em necessidade de uma “língua solta”.

Lembro de quantas vezes fui questionada sobre minha nacionalidade russa enquanto vivia nos States, ignorando inocentemente a razão da pergunta, que agora se mostra tão clara.

Seguindo a linha de raciocínio que meu sotaque era confundido com russo por causa da minha língua presa, posso sugerir a idéia de que russos, em sua maioria, também têm a língua presa! Teoria tão clara quanto àquela:

“Deus é amor.
O amor é cego.
Stevie Wonder é cego.
Logo, Stevie Wonder é Deus.”

Para contrastar com a tal língua presa, desenvolvi meu senso (crítico) de humor e soltei a língua! Se meu freio lingual não permite que a língua se estenda pouco mais de um centímetro fora da boca, meu pensamento veloz faz com que ela viaje quilômetros usando apenas de algumas palavras escolhidas às pressas.

É aí que entra o rabo...

Língua presa e o rabo solto me definem da melhor maneira possível. Não estar presa à algo que me comprometa é tão bom quanto poder falar o que tenho vontade, aonde eu tenho vontade!

Nenhum comentário: